Demônios libertados pela onda de autoritarismo dos justiceiros de Curitiba estão diante de seu pior momento e, ameaçados pelos fatos, fazem o que lhes cabe: esperneiam
Sabia-se, especialmente entre os desonestos intelectuais que encontramos em rodas de amigos e almoços de família, que o Golpe Parlamentar de 2016 liberaria instintos primitivos na sociedade brasileira
Desde o golpe parlamentar de 2016, que arrancou ilegalmente uma presidente do poder, sabia-se que os demônios da extrema direita, como os idiotas de Nelson Rodrigues, perderiam a modéstia. Sabia-se, especialmente entre os desonestos intelectuais que encontramos com surpreendente facilidade em rodas de amigos e almoços de família, que era a senha para que as portas dos instintos mais primitivos da sociedade patriarcal brasileira fossem escancarados. A Casa Grande ficou atrevida. Os justiceiros de Curitiba, bandidos de paletó e gravata, viram no Golpe a chance única de colocar em marcha todo seu sebastianismo. Autorizados por grande parte da mídia, que embarcou no macarthismo de Deltans da vida, procuradores do Ministério Público Federal sentiram-se encorajados, como acusadores, a combinar sentenças com julgadores. Fizeram mais. Fizeram troça daqueles que acorrentaram em masmorras institucionais. Eivados de um indisfarçável preconceito de classe, festejaram, em redes de papos, as conquistas de seu Tribunal de Inquisição, debochando das raízes simples daqueles que jogaram ao linchamento público. Fizeram mais ainda. Copiaram e colaram sentenças para condenar um ex-presidente, empurrá-lo para uma cela e impedí-lo de participar de eleições que , de acordo com todas as pesquisas disponíveis à época, venceria com facilidade. Não pararam de “fazer”. Pariram um acéfalo para chamar de seu e o colocaram na Presidência da República. Foi uma festa para brancos, ricos, velhos , armamentistas e reacionários que puderam, então , ser localizados na cadeira ao lado, no churrasco com os “amigos” ou mesmo, no almoço de domingo com familiares “insuspeitos”. “Fazer” é para os fortes. Herói dos puros e brancos, o Torquemada de Curitiba vislumbrou então a oportunidade de chegar ao poder pelas mãos do estúpido que ajudou a eleger. Não pensou duas vezes para materializar a desfaçatez. Abandonou a magistratura, virou ministro do impostor enquanto mantinha a “ameaça de barbas” no calabouço. O resto, até os javalis caçados por broncos ( e brancos) apoiadores do “Capitão”, já sabem: vieram o armamentismo “chavista” da população ( é curioso como temem a Venezuela mas “venezualizam” as milícias formadas por respeitados “trogloditas de bem”), a vulgarização da Presidência da República, o incêndio da Amazônia, a vergonha internacional , a agenda medieval de costumes e, por fim, o genocídio de 270 mil brasileiros por uma “gripezinha” que “não faz mal para os corajosos” mas empilha, aos milhares, cadáveres de “fracos”. Entretanto, como ensina a história, nada é para sempre. Nem mesmo as consequências de uma regressão institucional sem precedentes. A escuridão não é eterna. Nunca foi. Os fluxos e refluxos da história - para desespero dos demônios então liberados pela onda de autoritarismo dos justiceiros de Curitiba – mostram que depois das trevas, sempre há luz. Ficar do lado certo da história às vezes é, sobretudo, um exercício convicto de isolamento . Ficar do lado certo dos fatos às vezes é, antes de mais nada, confrontar amigos e familiares. Ficar do lado certo dos acontecimentos é não ceder ao coração e, em nome do “afeto”, abandonar a verdade. Não foram poucos os momentos que este jornalista, como tantos outros , viu-se cercado por pressões explícitas ou vagabundamente dissimuladas de amigos, colegas de trabalho, contratantes e familiares para “seguir a multidão”. Lamento, mas a manada e seu comportamento nunca me interessaram. Pouco me importa o que pensam “amigos de longa data”, colegas de trabalho adeptos do “ovelhismo” , leitores, parentes, irmãos “amorosos” e todo o pacote da pieguice malandra. Me dou o direito, como jornalista com mais de 30 anos de profissão (comecei aos 19) , de fazer o que Dona Vera, minha mãe (a quem devo, e tão somente a ela, dos pés à cabeça, toda minha independência intelectual) ensinou: “seja”. Se você, como meu leitor, está desconfortável com o que lê, basta sumir daqui. O que me seduz é a inteligência do interlocutor. Não estou atrás de tolos.

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